terça-feira, 25 de janeiro de 2011

A viagem parte dois

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A viagem



Hoje acordei cedo, e pela vidraça vi a chuva lá fora. Era uma chuva miúda, molhadeira, daquelas que cavam a terra desenterrando vidas e dando alegria a natureza. Cearense é assim mesmo, lírico e apaixonado por chuva. Lembrei-me de que em vinte dias que passei no ceará, chovera apenas duas vezes: Na chegada e na saída. A chuva lá fora, continua me impedindo de fazer minha atividade física que é a caminhada. E não podendo exercitar o físico exercitem a mente. A luz da sala apagada torna um ambiente tênue, ideal para sonhar. E a Gabriela deitada no sofá, olha fixamente a chuva... Enquanto isso, Dalva em uma cadeira de balanço, faz crochê... Que monotonia! Parece até um poema de Drummond!

Disse na primeira parte de “A viagem” que meu sofrimento no ônibus para o ceará eu não iria contar. Mas quando se pretende escrever sobre algo, deve estar preparado, conhecendo pequenos detalhes e seus meandros para não perder o fia da meada.E dessa forma poderemos omitir alguma coisa. Isso muitas vezes ocorre, ou por preguiça ou para compor melhor o texto, ou ainda por incapacidade de descrever ambiente e situações abstratas em que a linguagem foge da descrição material.Ao escrever um texto, você tem o livrearbítrio. Deus foi muito generoso conosco nos dando um pouco do seu poder, sem essa liberdade como poderiamos escolher? Tudo que acontece a um homem está nas mãos de Deus, se ele é alto ou baixo, pobre ou rico, inteligente ou não, mas se ele é correto ou mau não está nas mãos de Deus. Mas ele colocou-o na mão do homem dois caminhos de forma que ele possa escolher o modo de temer a Deus. Um sentimento de dor pode ser descrito de várias maneiras e não apenas com um simples ai! quando usamos uma palavra estamos fazendo uma escolha. Talvez seja esse o motivo porque muitos abrem mão de sua liberdade, por não saber o que fazer com ela.A falta de banho poderia muito bem demonstrar nossa fadiga de viajante que sofre.Aguém que ganhou recentimente muito dinheiro, poderemos chamá-lo de novo-rico, ou de emergente; em vez de países comunistas, países de economia centralizada. Quando queremos argumentar desfavoravelmente a prisioneiros de uma casa de detenção os tratamos como assassinos ou bandidos; mas se argumentar-mos favoravelmente, diríamos:

- São seres humanos, e tanto o quanto nós, filhos de Deus!

Voltando à viagem, em Volta Redonda entrou uma cearense com uma criança. Devia esta fugindo do marido, se já é difícil viajar com uma criança de sete anos imagina uma de colo. O sofrimento não é tanto para a criança e sim para o adulto. Viajava ela com passagem apenas de ida, sem previsão de volta, embora nós também estivéssemos nessas condições, com passagem apenas de ida. Mas esse detalhe, mesmo que pequeno, serviu para reforçar minhas suspeitas de que estava fugindo do pai da criança. Era uma bela e jovem mulher e que não largava aquela criança um segundo sequer, fazia tudo com a criança em seus braços. Eu viajava ao lado da janela, pois sempre procuro esse lado para apreciar melhor a paisagem, e como uma napéia ela sentou-se em sua poltrona ao meu lado, que tentação! Quando passamos em V. Redonda eram umas dezenove horas mais ou menos, e o sol esmaecia no horizonte. E foi exatamente lá que entrou o pecado, e que por acaso, fui escolhido como seu escravo. A ninfa do ceará sem nenhuma cerimônia, levantando um pouco a blusa expôs um de seus lindos seios, de aréola escura e de bicos retintos, mas não era daqueles que você poderia com certo esforço deixar de olhar, sei que seu ato foi puramente materno, não foi para que eu visse, e sim para que seu filho pudesse alimentar-se, só que tenho um instinto masculino aético e que não aceita as convenções sociais. Estou sempre em conflito com ele. Esse tira e guarda de peito foi à viagem toda, a criança mamando e eu me torturando, tal qual um anacoreta. De tanto a criança mamar, vomitou todo seu precioso leite mamado, e não adianta chorar o leite derramado, esse quadro acabou provocando vômito também em uma outra garota e logo em seguida minha filha, que nunca havia vomitada antes.

Vamos procurar esquecer um pouco os seios maternos para que a narração não tome outro rumo. E juntos vamos descobrir porque uma coisa tão bela como ver através da janela de um ônibus a paisagem, se torna tão cansativa quando a viagem é longa... Isso porque dizem que o melhor momento para se escrever é no sofrimento. Acho que assim sendo eu precisaria ter sofrido mais.A cearense deveria ter me torturado mais, se bem que mais do que ela fez seria atentado ao pudor! Pois em alguns momentos ela não expunha apenas um e sim dois lindos seios de mamilos arredondados. Quer tortura maior que essa? Isso só pode ser assédio gente! Muito bem disse Hamlet a Horácio, que “há mais coisas entre o céu e a terra que nossa vã filosofia” grande Shakespeare! Que soube colocar belas e sábias palavras na boca de seu personagem. Aluisio Azevedo também diria da ninfa dos lábios de mel que ela era um mistério... A luz ardente do meio dia, ela era o calor vermelho das sestas da fazenda, era o aroma quente dos trevos e das baunilhas, que o atordoara nas matas brasileiras, era o veneno e o açucar gostoso, era o sapoti mais doce que o mel e as aréolas de seus seios mais pretos que as asas da grauna. Presenciando toda essa beleza e muitas vezes vendo a monstruosidade e a falta de sorte imperar sobre muitos seres humanos, e mesmo assim viverem esbanjando alegria, nos faz refletir sobre nossos valores. Bom sobre esse tema eu falarei na próxima parte de " A Viagem " e da a ninfa dos lábios de mel também, claro!







Francisco Gonçalves de Oliveira

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