domingo, 10 de outubro de 2010

Gotas de Orvalho



A gota de sangue e a gota de orvalho
São humildes e enormes.
A minha dor é orvalho,
Minha lágrima é sangue,
Meu ser completamente em estado
De busca permanente.
Pura e insistente reciprocidade
de carinho,
É tudo o que busco.
É tudo que ouso pedir
À pessoa que me desvendar
E me receber, assim humilde,
simples gota de sangue
Pulsando vida.

Esse é um poema publicado na ante capa do meu livro Gotas de Orvalho. Um livro com poemas de dois autores eu e o Germano dos Santos de oliveira. Na verdade esse livro era para ser chamado Gota de Orvalho em homenagem a uma namorada do Germano, mas para que essa homenagem ficasse camuflada por problemas óbvios, ficou sendo Gotas de Orvalho.

Eleições 2010





Dois Pesos...
Maria Rita Kehl
O Estado de São Paulo, 2/10/2010



Este jornal teve uma atitude que considero digna: explicitou aos
leitores que apoia o candidato Serra na presente eleição. Fica assim
mais honesta a discussão que se faz em suas páginas. O debate
eleitoral que nos conduzirá às urnas amanhã está acirrado. Eleitores
se declaram exaustos e desiludidos com o vale-tudo que marcou a
disputa pela Presidência da República. As campanhas, transformadas em
espetáculo televisivo, não convencem mais ninguém. Apesar disso,
alguma coisa importante está em jogo este ano. Parece até que temos
luta de classes no Brasil: esta que muitos acreditam ter sido
soterrada pelos últimos tijolos do Muro de Berlim. Na TV a briga é
maquiada, mas na internet o jogo é duro.

Se o povão das chamadas classes D e E – os que vivem nos grotões
perdidos do interior do Brasil – tivesse acesso à internet, talvez se
revoltasse contra as inúmeras correntes de mensagens que desqualificam
seus votos. O argumento já é familiar ao leitor: os votos dos pobres a
favor da continuidade das políticas sociais implantadas durante oito
anos de governo Lula não valem tanto quanto os nossos. Não são
expressão consciente de vontade política. Teriam sido comprados ao
preço do que parte da oposição chama de bolsa-esmola.

Uma dessas correntes chegou à minha caixa postal vinda de diversos
destinatários. Reproduzia a denúncia feita por “uma prima” do autor,
residente em Fortaleza. A denunciante, indignada com a indolência dos
trabalhadores não qualificados de sua cidade, queixava-se de que
ninguém mais queria ocupar a vaga de porteiro do prédio onde mora. Os
candidatos naturais ao emprego preferiam viver na moleza, com o
dinheiro da Bolsa-Família. Ora, essa. A que ponto chegamos. Não se
fazem mais pés de chinelo como antigamente. Onde foram parar os
verdadeiros humildes de quem o patronato cordial tanto gostava,
capazes de trabalhar bem mais que as oito horas regulamentares por uma
miséria? Sim, porque é curioso que ninguém tenha questionado o valor
do salário oferecido pelo condomínio da capital cearense. A troca do
emprego pela Bolsa-Família só seria vantajosa para os supostos
espertalhões, preguiçosos e aproveitadores se o salário oferecido
fosse inconstitucional: mais baixo do que metade do mínimo. R$ 200 é o
valor máximo a que chega a soma de todos os benefícios do governo para
quem tem mais de três filhos, com a condição de mantê-los na escola.

Outra denúncia indignada que corre pela internet é a de que na cidade
do interior do Piauí onde vivem os parentes da empregada de algum
paulistano, todos os moradores vivem do dinheiro dos programas do
governo. Se for verdade, é estarrecedor imaginar do que viviam antes
disso. Passava-se fome, na certa, como no assustador Garapa, filme de
José Padilha. Passava-se fome todos os dias. Continuam pobres as
famílias abaixo da classe C que hoje recebem a bolsa, somada ao
dinheirinho de alguma aposentadoria. Só que agora comem. Alguns já
conseguem até produzir e vender para outros que também começaram a
comprar o que comer. O economista Paul Singer informa que, nas cidades
pequenas, essa pouca entrada de dinheiro tem um efeito surpreendente
sobre a economia local. A Bolsa-Família, acreditem se quiserem,
proporciona as condições de consumo capazes de gerar empregos. O voto
da turma da “esmolinha” é político e revela consciência de classe
recém-adquirida.

O Brasil mudou nesse ponto. Mas ao contrário do que pensam os
indignados da internet, mudou para melhor. Se até pouco tempo alguns
empregadores costumavam contratar, por menos de um salário mínimo,
pessoas sem alternativa de trabalho e sem consciência de seus
direitos, hoje não é tão fácil encontrar quem aceite trabalhar nessas
condições. Vale mais tentar a vida a partir da Bolsa-Família, que
apesar de modesta, reduziu de 12% para 4,8% a faixa de população em
estado de pobreza extrema. Será que o leitor paulistano tem ideia de
quanto é preciso ser pobre, para sair dessa faixa por uma diferença de
R$ 200? Quando o Estado começa a garantir alguns direitos mínimos à
população, esta se politiza e passa a exigir que eles sejam cumpridos.
Um amigo chamou esse efeito de “acumulação primitiva de democracia”.

Mas parece que o voto dessa gente ainda desperta o argumento de que os
brasileiros, como na inesquecível observação de Pelé, não estão
preparados para votar. Nem todos, é claro. Depois do segundo turno de
2006, o sociólogo Hélio Jaguaribe escreveu que os 60% de brasileiros
que votaram em Lula teriam levado em conta apenas seus próprios
interesses, enquanto os outros 40% de supostos eleitores instruídos
pensavam nos interesses do País. Jaguaribe só não explicou como foi
possível que o Brasil, dirigido pela elite instruída que se preocupava
com os interesses de todos, tenha chegado ao terceiro milênio contando
com 60% de sua população tão inculta a ponto de seu voto ser
desqualificado como pouco republicano.

Agora que os mais pobres conseguiram levantar a cabeça acima da linha
da mendicância e da dependência das relações de favor que sempre
caracterizaram as políticas locais pelo interior do País, dizem que
votar em causa própria não vale. Quando, pela primeira vez, os
sem-cidadania conquistaram direitos mínimos que desejam preservar pela
via democrática, parte dos cidadãos que se consideram classe A vem a
público desqualificar a seriedade de seus votos.

sábado, 2 de outubro de 2010

Sistema Eleitoral Cubano



O Sistema Político e Eleitoral em

Cuba

O questionar constante do sistema político e eleitoral cubano constitui um dos pilares fundamentais da campanha inimiga contra nosso país, liderada pelos Estados Unidos. A atividade contra Cuba em matéria de democracia e direitos humanos, não só constitui a principal ferramenta dos Estados Unidos para tratar de “legitimar” sua política de hostilidade e agressão contra Cuba; senão que responde também ao interesse dos principais países capitalistas industrializados de impor aos países em desenvolvimento um modelo de organização política que facilite a dominação.

Em sua campanha contra Cuba, Washington pretende demonstrar a incompatibilidade do sistema político que estabelece a Constituição do país com as normas internacionalmente aceitas em matéria de democracia e direitos humanos e fabricar a imagem de uma sociedade intolerante que não permite a mínima diversidade e pluralidade política. Para isso, conta com poderosos instrumentos de propaganda e abundantes recursos que utiliza para o recrutamento, organização e financiamento de pequenos grupos contra-revolucionários que apresenta como “oposição política”, tanto dentro como fora do país.

A manipulação do conceito da democracia pelas principais potências ocidentais atingiu recentemente magnitudes muito perigosas. Aqueles que se afastam do modelo democrático que preconizam, dos padrões e valores que promovem, não só são submetidos a fortes críticas através da propaganda e das instituições internacionais que controlam a chamada “defesa da democracia”, como também se convertem em potenciais “vítimas” da doutrina de intervenção que desenvolvem as potências imperialistas.

Cuba defende e apoia o direito dos povos à livre determinação, reconhecida internacionalmente como um direito inalienável no consenso atingido na Conferência Mundial de Direitos Humanos, celebrada em Viena, em 1993. Na própria Declaração e Programa de Ação de Viena se estabeleceu, assim mesmo, que “a democracia se baseia na vontade do povo, livremente expressa, para determinar seu próprio regime político, econômico, social e cultural e em sua plena participação em todos os aspectos da vida”, e se reconheceu a importância “das particularidades nacionais e regionais, bem como dos diversos patrimônios históricos, culturais e religiosos”.

É sobre a base destes postulados, ignorados abertamente pelos que tentam impor seus modelos como “únicos”, que se erige o sistema político cubano, um modelo escolhido e defendido pelos próprios cubanos, genuinamente autóctone e autêntico, fundamentado na igualdade e solidariedade entre os homens e mulheres, na independência, na soberania e na justiça social.

Nosso país já conheceu o modelo que hoje tentam impor-lhe, já viveu a triste experiência do sistema de “vários partidos” e “representativo” que lhe receitou os Estados Unidos, e que trouxe, como conseqüência, a dependência externa, a corrupção, o analfabetismo e a pobreza de amplos setores da população, o racismo, em resumo, a completa negação dos mais elementares direitos individuais e coletivos, incluindo o direito a umas eleições verdadeiramente livres e democráticas.

Este sistema e a permanente política de ingerência norte-americana, não só criaram dirigentes ladrões e corruptos, como impuseram ditaduras tirânicas e assassinas, promovidas e apoiadas diretamente pelo governo dos Estados Unidos.

Por tudo isso, a Revolução cubana não podia assumir este sistema se, verdadeiramente, queria resolver os males herdados. Desta forma, o país se propôs a desenhar seu próprio modelo, para o qual, remexeu em suas próprias raízes e foi ao pensamento social, humanista e patriótico dos mais preclaros proveres da nação cubana.

O primeiro que teria que sublinhar então para explicar o sistema político cubano, é que nosso modelo não é importado, nunca foi uma cópia do modelo soviético, nem do existente nos países socialistas naquele momento, como quiseram fazer ver os inimigos da Revolução. O sistema político de Cuba nasce e se corresponde com o devir da evolução histórica do processo político-social da nação cubana, com seus acertos e desacertos, com seus avanços e retrocessos. O fato de que a formação e desenvolvimento da nação cubana, durante seus mais de 130 anos de existência, tenham enfrentado praticamente os mesmos fatores externos e internos, favoreceu uma história coerente, permitindo desenvolver a ideia de construir uma nação forjada pelos próprios cubanos.

A existência de um só partido no sistema cubano está determinada, entre outros, por fatores históricos e contemporâneos. Nosso Partido é a continuidade histórica do Partido Revolucionário Cubano fundado por José Martí para unir todo o povo, com o objetivo de atingir a absoluta independência de Cuba. Aqueles fatores que deram origem a dito Partido, libertar Cuba e impedir sua anexação aos Estados Unidos, são os mesmos que estão presentes hoje quando nosso povo enfrenta um férreo bloqueio econômico, comercial, financeiro e outras ações hostis que têm como objetivo depor o governo e destruir o sistema instaurado no país por decisão soberana de todos os cubanos.

Nosso Partido desenvolve seu labor mediante a persuasão, o convencimento e em estreita e permanente vinculação com as massas, e as decisões que adota são de obrigatório cumprimento, unicamente, para seus militantes. Não é um partido eleitoral e lhe está proibido, não só de nomear candidatos, como de participar em qualquer outro momento do processo eleitoral. Esta concepção e esta prática garantem que, num sistema onde existe um só partido, desenvolva e prevaleça a mais ampla pluralidade de opiniões.

Características do sistema político e eleitoral cubano:

1. Inscrição universal, automática e gratuita de todos os cidadãos com direito a voto, a partir dos 16 anos de idade.

2. Postulação dos candidatos diretamente pelos próprios eleitores em assembleias públicas (em muitos países são os partidos políticos os que nomeiam os candidatos).

3. Inexistência de campanhas eleitorais discriminatórias, milionárias, ofensivas, difamatórias e manipuladas.

4. Total limpeza e transparência nas eleições. As urnas são custodiadas por meninos e jovens pioneiros, são seladas na presença da população e a contagem dos votos se faz de maneira pública, podendo participar a imprensa nacional e estrangeira, diplomatas, turistas e todos o que desejarem.

5. Obrigação de que todos os eleitos o sejam por maioria. O candidato só é eleito se obtiver mais de 50% dos votos válidos emitidos. Se este resultado não for atingido no primeiro turno, irão ao segundo os dois que mais votos obtiveram.

6. O voto é livre, igual e secreto. Todos os cidadãos cubanos têm o direito de eleger e ser eleitos. Como não há lista de partidos, vota-se diretamente no candidato que se deseje.

7. Todos os órgãos representativos do Poder do Estado são eleitos e renováveis.

8. Todos os eleitos têm que prestar conta de sua atuação.

9. Todos os eleitos podem ser revogados em qualquer momento de seu mandato.

10. Os deputados e delegados não são profissionais, portanto não recebem salário.

11. Alta participação do povo nas eleições. Em todos os processos eleitorais que se celebraram desde o ano 1976, participaram mais de 95% dos eleitores. Nas últimas eleições para Deputados, em 1998, votaram 98,35% dos eleitores, sendo válidos 94,98% dos votos emitidos. Foram anulados 1,66% dos votos e, em branco, só 3,36%.

12. Os Deputados à Assembleia Nacional (Parlamento) elegem-se para um mandato de 5 anos.

13. A integração do Parlamento é representativa dos mais variados setores da sociedade cubana.

14. Elege-se um deputado por cada 20 000 habitantes, ou fração maior de 10 000. Todos os territórios municipais estão representados na Assembleia Nacional e o núcleo base do sistema, a circunscrição eleitoral, participa ativamente em sua composição. Cada município elegerá, no mínimo, dois deputados e a partir dessa cifra se elegerão, proporcionalmente, tantos deputados em função do número de habitantes. 50 % dos deputados têm que ser delegados das circunscrições eleitorais, os quais têm que viver no território da mesma.

15. A Assembleia Nacional elege, dentre seus Deputados, o Conselho de Estado e o Presidente do mesmo. O Presidente do Conselho de Estado é Chefe de Estado e Chefe de Governo. Isso quer dizer que o Chefe do Governo cubano tem que se submeter a dois processos eleitorais: primeiro, tem que ser eleito como Deputado pela população, pelo voto livre, direto e secreto e depois pelos Deputados, também pelo voto livre, direto e secreto.

16. Ao ser a Assembleia Nacional o Órgão Supremo do Poder do Estado e estando subordinada a ela as funções legislativas, executivas e judiciais, o Chefe de Estado e de Governo não pode dissolvê-la.

17. A iniciativa legislativa é patrimônio de múltiplos atores da sociedade, não só dos deputados, do Tribunal Supremo e da Promotoria, como também das organizações sindicais, estudantis, de mulheres, sociais e dos próprios cidadãos, requerendo-se, neste caso, que exercitem a iniciativa legislativa o mínimo de 10 000 cidadãos que tenham a condição de eleitores.

18. As leis se submetem ao voto majoritário dos Deputados. O específico do método cubano é que uma lei não se leva à discussão do Plenário até que se esgotem consultas reiteradas aos deputados, levando em conta as propostas que fizeram, devendo ficar claramente demonstrado que existe o consentimento majoritário para sua discussão e aprovação. A aplicação deste conceito adquire relevância maior quando se trata da participação da população, conjuntamente com os deputados, na análise e discussão de assuntos estratégicos. Nessas ocasiões, o Parlamento se desloca aos centros trabalhistas, estudantis e camponeses, fazendo-se realidade a democracia direta e participativa.

O expresso, até aqui, põe em evidência a essência da democracia cubana, do sistema que instituiu, referendado e apoiado pela imensa maioria dos cubanos.

No entanto, não pretendemos ter atingido um nível de desenvolvimento democrático perfeito. A principal qualidade do sistema político cubano é sua capacidade para o constante aperfeiçoamento em função das necessidades propostas para a realização de uma participação plena, verdadeira e sistemática do povo na direção e no controle da sociedade, essência de toda democracia.

Fonte: Ministério das Relações Exteriores da República de Cuba