terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Petição

1/3/2008
PETIÇÃO

Petição



A melhor forma de solicitar alguma coisa, acho, ainda é através do talento. Quando Jânio Quadros era prefeito de S. Paulo recebeu uma insólita petição, em verso, de um médico da capital que havia perdido seu carro em conseqüência da queda de uma árvore.

O médico escreveu para o gabinete do prefeito que autorizou sua publicação no Diário Oficial do Município do dia, 04/07/87 Sábado. O seguinte:



Excelentíssimo Senhor

Jânio da Silva quadros

Prefeito do Município



Minha história de natal,

A começar do princípio,

Vem dum fato trivial,

Uma árvore morreu

Nas ruas da capital.



Só que o carro era o meu

(o que se vê no postal)

Foi isso que aconteceu

Na véspera do meu natal.



Não ventava, nem chovia,

Era um dia bem normal,

E meu carro, junto à guia,

Parado em lugar legal.



Quem vive da medicina

Não pode-caso direi-

Se uma árvore cai em cima

Substituir um Del Rey.



Não era novo, era usado,

Dos anos oitenta e um,

Eu já estava acostumado,

Não trocava por nenhum.



Agora está na oficina,

Com os carros remendados,

E o orçamento imagina,

São setenta mil cruzados.



Junto vai meu holerite

Pra mostrar a situação

De quem cura apendicite

Na barriga do povão.



Eu digo, com muita dor:

Exercer a medicina

Na função de professor

É uma dor que desatina

Profissional de valor.



Em qualquer país distante,

Ensina-se só medicina:

Mas não cabe numa estante

Aquilo que aqui se ensina.



Pois num país como o nosso

Cada médico precisa

Lembrar-se, ter a certeza,

Que ao lado da doença

Há também que combater

Miséria, atraso e pobreza.



Se assim escrevo ao senhor

É pra pedir um conselho,

E me diga, por favor,

Como fosse caso alheio.



Como devo proceder

Para ser indenizado?

Ou o destino assim quis,

Sou eu que sou azarado.



Sou homem de estimação

Educado com ternura

Deverei mover ação

Importunar prefeitura?



Espero que sua resposta

Influa na vida minha.

Ou a vida é sem resposta

E sem rumo é que caminha?



Marcelo Toledo



Mas o Jânio, aquele que disse que fi-lo porque quí-lo, como professor de lingua portuguesa quis fazer bonito e respondeu:



O bom médico Toledo

Pediu indenização

E requereu-a sem medo

De receber o meu “não”.



A árvore caiu por cima

Do carro de estimação

E ele menciona a sina

Que parece maldição.



O vegetal era nosso

Como o prova a petição

Devo pagar, e eu posso.

A pobre indenização.



O remédio, pois, eu acho

É saldar o prejuízo

Assim decido e despacho

Ao Manhães que tem juízo.



J. quadros, prefeito



É inegável que a capacidade do médico em inovar na petição muito contribuiu na resolução do problema.



Francisco Gonçalves de Oliveira

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